sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Efésios 3

Uma carta de conforto, por alguém que é prisioneiro, para homens livres. Em uma situação normal era Paulo que estaria recebendo mensagens de apoio, por ter sido preso, a fim de se manter firme, com esperança. Mas aquele homem não precisava de nada disso. Ele já vivia a esperança da eternidade plenamente, e não seriam cadeias que iriam roubar isso dele. A única coisa que evidentemente o incomodava era não poder estar pregando o evangelho. De qualquer forma, não era ele quem recebia as mensagens de apoio, mas ele as escrevia, para uma igreja que podia ter sua fé abalada por causa da prisão de seu missionário. O que Paulo enfatiza é que sua reclusão é, de uma perspectiva celestial, uma grande bênção1. Ela era sinal de que ele estava cumprindo o seu chamado, pregando aos gentios e os ensinando sobre o mistério oculto de Deus, que é a salvação dos povos pagãos, em Cristo Jesus. Instava-os a manterem-se firmes, certos de que tudo o que ele estava passando era para a bem daquelas pessoas. De maneira geral, as tribulações de Paulo eram a confirmação de que os gentios estavam sendo evangelizados e se convertendo a Cristo.

Paulo aceitou o seu chamado sem reservas. Quando Jesus o fez apóstolo para os gentios, ele sabia que passaria por muitas tribulações por causa disso. Porém, jamais recuou, jamais contestou sua condição, jamais questionou a razão dessas dificuldades. E isso acontecia porque ele enxergava muito além do homem ordinário. Sua compreensão do mistério divino o fez contemplar uma realidade supra cósmica que o libertava das amarguras terrenas, o fazia suportar tudo sem nunca esmorecer. O pregador assumiu seu chamado com todas as conseqüências relativas a ele. Quando aceitou pregar o evangelho fora de Israel, com uma mensagem que iria incomodar tanto judeus como não judeus, tinha a certeza que seria perseguido, machucado e preso. Ainda assim, ele manteve-se firme no propósito de Deus, e cumpriu sua vocação irrepreensivelmente. Dizia, inclusive, que nenhuma tribulação poderia afastar um cristão do amor de Deus e, mesmo passando por qualquer dificuldade, sabia que era mais que vencedor2.

Esta carta de Paulo, claramente, procura explicar para a igreja o que Deus revelou para ele. Em síntese, é a demonstração de que os gentios também tinham parte no plano de salvação divino, que este não era apenas para os judeus, mas uma possibilidade universal. Sabia, porém, que até aquele momento, essa realidade era um mistério oculto, ou seja, uma verdade que existia, mas não havia sido ainda revelada. E Deus escolheu exatamente Paulo para receber essa revelação e mais, para administrá-la. Isso significa que ele era o arauto de Deus para os povos pagãos. Foi ele o incumbido de deflagrar essa mensagem e explicá-la.

Havia plena consciência, no apóstolo, de que sua mensagem era nova para os homens, e talvez até mesmo incompreensível, principalmente para os judeus. Tendo sido ele um zeloso religioso, sabia muito bem o que pensavam seus antigos pares e como compreendiam a relação de Deus com o povo de Israel. A pregação para os gentios, sem o proselitismo tradicional judaico, pelo contrário, mesmo liberando os pagãos de se agregarem à religião judaica, só poderia trazer escândalo e ódio por parte de seus concidadãos. Mas este era seu chamado, e como já dito, Paulo o aceitou plenamente.

Aquele homem sabia, inclusive, que o mistério revelado a ele era tão grande, que não era conhecido nem mesmo de anjos e demônios. Essa é uma passagem impressionante desta carta. Ele diz que para ele foi dada a graça de anunciar aos gentios o mistério que esteve oculto em Deus, para que, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades nos céus3.

No entanto, que não se confundam, nem se embaracem num aparente paradoxo. O mistério oculto (salvação dos gentios) era um mistério para os homens, mas estava em Deus por toda a eternidade. Desde o princípio havia um plano de salvação para os pagãos, o qual foi colocado em evidência no momento certo. Os gentios não são uma sobra da salvação rejeitada pelos judeus, mas estavam, sim, dentro dos propósitos divinos desde toda a eternidade4. Quando na carta aos Romanos Paulo diz que o evangelho é o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê: primeiro do judeu e também do grego5, claramente está evidenciando uma ordem cronológica de apresentação dessa salvação, jamais uma ordem preferencial.

Paulo assumiu com amor o seu chamado e desejou, ardentemente, compartilhar a verdade do evangelho com todas aquelas pessoas. Ansiava por vê-las aos pés de Cristo, deixando para trás seus cultos místicos idólatras. Queria muito que eles compreendessem a verdade da salvação de Deus, mas sabia que tal compreensão só poderia ser alcançada se houvesse uma intervenção real do Espírito Santo, seguida de uma fé incontestável em seus corações e amor irrepreensível em suas almas6. Com todas essas coisas entranhadas no espírito humano, aí sim, poderiam eles alcançar o nível de compreensão das coisas.

Quando Paulo diz que os santos poderão compreender perfeitamente qual seja a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade7, está deixando claro que aquilo que Deus revelou é possível ser compreendido pela mente humana. Diferente de tantos gnósticos que sempre insistiram na necessidade do uso de ritos místicos para se alcançar uma compreensão das coisas elevadas, a Bíblia nos ensina que o homem possui capacidade para entender os propósitos de Deus. Diante disso, vê-se que há dois erros comuns nesta questão: um daqueles que acreditam que apenas por meio de 'rituais misteriosos' se alcança verdades superiores e outro dos que acreditam que a razão, por si só, é capaz de entender a vontade divina. Na verdade, o homem pode, sim, em sua razão, compreender as realidades celestiais reveladas, porém, só alcançará isso, se tiver fé, e amor em Cristo Jesus. Nós não sabemos qual a real capacidade de um cérebro humano, mas podemos dizer, sim, que há coisas que não são simplesmente compreensíveis logicamente, mas demandam uma compreensão mais ampla, que envolve também a intuição e o sentimento. São verdades que simplesmente são, e talvez nem saibamos porque o são, mas que as percebemos num ato cognitivo direto. Isso não tem nada a ver com misticismo, mas é a realidade da constituição do próprio homem. Dessa forma, quando Paulo clama a Deus para que Ele conceda o poder do Espírito Santo aos irmãos, para que eles alcancem uma compreensão inteira da realidade, está levando em consideração esse tipo de compreensão, que não é apenas místico, mas também não é apenas racional, na verdade é uma compreensão com todo o ser (razão, sentimento, intuição e percepção).

Uma das maiores críticas que se faz a qualquer religião é o fato de ela ser achar a 'dona da verdade'. Em primeiro lugar, não há como ser diferente. Uma religião que não tivesse certeza do que prega não poderia ser uma religião, pois quem a seguiria se nem mesmo ela tivesse certa de seus preceitos? Mas, em relação ao cristianismo, isso é ainda mais evidente, afinal ele arroga a si a explicação não apenas do universo, mas de toda a realidade. Isso é um absurdo para os céticos e agnósticos, conduzindo-os a desferirem os mais duros golpes contra a fé cristã, chamando-a de intolerante e soberba. Ocorre que esses críticos jamais poderão compreender o que a Bíblia diz, pois não possuem em princípio a fé. Sendo assim, não têm o amor a Deus que harmoniza todas as coisas, E, por fim, negam a própria percepção, ignoram a própria sensibilidade que, sem dúvida, mostra para eles que há um Deus criador de todas as coisas. O que o cristão faz é exatamente o contrário: ele percebe e sente que há realmente um Deus; antes de compreendê-lo, crê; antes de explicá-lo, ama-o; e depois disso é abençoado com o entendimento das coisas.

Ainda assim, sabemos que há verdades que nem a mente humana pode compreender. Um exemplo é o amor de Cristo8. A razão humana não consegue entender o que move Deus a demonstrar tamanho amor. Como já vimos, Cristo morreu por pessoas que estavam contra Ele, em rebelião. Nenhuma compreensão é possível para isso, nenhum raciocínio pode explicar essa ação. Apenas sabemos que ela é real, mesmo sem podermos explicá-la.

Outra verdade que está além de nossa compreensão é o poder de Deus. O que Ele pode fazer vai muito além do que podemos imaginar. Apesar de sabemos que Deus é infinito em poder, não sabemos exatamente o que isso significa. Não há limite, Ele pode tudo? Nos resignamos em aceitar que isso está além de nossa compreensão.

Está claro, portanto, neste trecho da carta de Paulo, que os gentios fazem parte da família de Deus, e, como todos os homens, têm acesso livre ao Pai, devendo, como qualquer ser humano sobre a face da terra, possuir fé para poder se achegar ao Salvador das almas, que é Jesus Cristo, nosso Senhor.

1Efésios 3.13
2Romanos 8.35-37
3Efésios 3.7-10
4Efésios 3.11
5Romanos 1.16
6Efésios 3.16-17
7Efésios 3.18
8Efésios 3.19