terça-feira, 24 de junho de 2008

Temos apenas o agora

Um coração grato será sempre feliz. Haverá nele um eterno reconhecimento de que o que tem, ou o que é, são a medida de sua existência, gratuitamente fornecidas por Deus. Enxergará, portanto, em si mesmo, a plenitude da existência, a realização do ser.


A tristeza é a insatisfação com o que se tem ou com o que se é. Ser triste é o estado de descontentamento com uma realidade atual. A tristeza é a voz da ausência, da falta.

O passado não mais é, o futuro ainda não é. Temos, apenas, a debilidade do presente; mas é o que temos. O que passou não deveria mais representar, em nós, qualquer forma de coação. Se o que se espera sequer se sabe se virá, então menos força deveria ter. O que é digno de moldar minha perspectiva é apenas o atual, o que é.

Muitos estão encarcerados em suas memórias. Reféns de suas experiências se conformam em serem modelados pelo que passou. São o que foram e nada são agora. Ser, de verdade, é criar todo dia. É transformar a realidade na direção do sempre novo. Aqueles que não aprimoram, não podem ser. Ignorando a natureza do ser, que sendo finito é também mutável, amarram-se ao que foram, como um cansado prisioneiro.

A imutabilidade pertence ao eterno. Nós, pobres mortais, biologicamente mortais, vivemos um constante devir. Éramos pequenos e frágeis, mal articulávamos as palavras. Nossas peles eram firmes e lisas. Nossas pernas bem nos sustentavam. Hoje crescemos, bem falamos. Nossos ossos, porém, doem, nossa pele enruga-se a cada dia e os joelhos reclamam das estações. Somos tudo, sonhamos tudo. Seremos, porém, reduzidos ao nada.

Negar isso é negar a natureza. Então, por que não deixar essa realidade nos ensinar alguma coisa? O passado passou. Esquecido? Jamais! O passado são tijolos em nosso edifício do ser. Ajudaram a construir o que hoje é, mas não são o edifício, pois esta construção é permanente. Adornos e enfeites são sempre acrescentados. Novas pinturas, fortalecimento da estrutura. Tudo isso faz parte da edificação que somos nós. O material bom se mantém e é aproveitado; o ruim vai sendo substituído conforme a possibilidade do real.

Edifício que já possui uma forma, mas não terminada, jamais terminada. Se quisermos ver algo estragar, basta deixarmos ele como ele é. A experiência nos ensina isso. Portanto, cuidamos de nossa construção com diligência. Há tantas coisas a acrescentar, tanto a fazer, tanto a melhorar! Imaginamos o futuro sempre melhor, planejamos assim.

Mas o futuro ainda não é e, provavelmente, não será exatamente como esperamos. Se vivermos nele, se formos hoje apenas o que se espera, na verdade não seremos. Um prédio inacabado, com um belo projeto. A perfeição futura sufocando a limitação presente. Lembremos: seremos sempre inacabados, essa é uma verdade inexorável! Quão triste será esse construtor, que na inconformidade da limitação presente, se alegra num projeto de perfeição que nunca encontrará a realidade.

Felizes são aqueles que alegram-se com o que conquistaram até aqui. Conscientes, vêem o passado nos tijolos de seus edifícios, sabendo que, na necessidade inevitável da conservação e aprimoramento, precisam, constantemente, substituir partes da estrutura.

Felizes os que olham para si e enxergam a vivacidade de uma construção em obras, vívida no movimento intenso do trabalho, aperfeiçoada continuamente na busca do ideal.

O conformado se entristece na paralisia. Não se alegra com o que é, pois o que é quedou inerte desde tempos; não sonha, não se orgulha, não vive. O sonhador se entristece na espera, pois o que é não é o que se quer e, talvez, jamais será; não se alegra, não se regozija, não vive.

Felizes são os que se rejubilam na satisfação do ser. Orgulhosos do que são, não pelo que são, mas pelo que, até aqui, puderam ser. Construídos pelo passado, norteados pelo futuro, mas existentes agora. Gratos pelo presente, o qual é a verdade do ser, levantam suas mãos para o céu e bradam: “Obrigado, Senhor!”