sexta-feira, 27 de maio de 2011

A trindade humana

O homem moderno está partido. Fragmentado pelos seus desejos e dividido pela vida moderna, ele sofre com a incompletude. Quer se achar, mas apenas se debate na insatisfação que o acompanha.

Diferente do que pensam os dualistas, o homem é um ser uno. Apesar de possuir uma parte material e outra imaterial, isso não o torna duplo. São partes que se completam, que dependem uma da outra, que formam o ser humano. E ele apenas o é se todas essas partes estiverem presentes.
Há três particões no homem: a inteligência, a vontade e o amor. A inteligência é a compreensão das coisas, a vontade, o impulso que o conduz e o amor, aquilo que une tudo. Essa é a trindade humana, e todos a possuem. No entanto, a completude só ocorre se todas elas se manifestarem plenamente. O homem só é completo quando todas suas partes se relacionam em harmonia.
A inteligência é o pensamento, mas mais que isso. É a razão e compreensão das coisas. É por ela que o homem tem consciência do mundo e de si. Por isso, pela inteligência ele não apenas se relaciona com o mundo, mas o entende. Também, é pela inteligência que ele compreende a Deus e por ela que ele o cultua, com um culto racional.
A vontade é o impulso gerador da ação. Por ela, o homem se lança à busca do seu desejo, do que quer. Pela vontade o homem tomas as decisões e parte para realizá-las. É a vontade que o tende para o Bem, que é Deus, e por ela se esforça a encontrá-lo.
O amor, por fim, é o que une a vontade e a inteligência. Sem ele, as outras duas partes humanas se perdem em seus próprios chamados. Por isso, sem amor, nada tem valor! É o amor que dá sentido a tudo. Por ele, as ações humanas e o seu entendimento não se esvaziam em si mesmos, mas tomam a dimensão do sentido geral, em comunhão com a verdade e tomando parte do que é de Deus. É pelo amor que o homem encontra o motivo para o que é e para o que faz. O amor dá sentido a tudo e é por ele que se encontra verdadeiramente a Deus.
O que ocorre, hoje, é que o homem se vê apenas por um de seus lados. Às vezes quer ser apenas entendimento, quer compreender, quer saber as coisas. No entanto, lhe falta a vontade para lançar-se nessa descoberta e o amor para se entregar a ela. Torna-se, então, um racionalista, cheio de conceitos, repleto de ideias, mas sem alma.
Também acontece de o homem lançar-se impetuosamente para as realizações. Querer os resultados, entregar-se aos trabalhos. Porém, não dedica o entendimento a essas coisas. Acredita que pode alcançar tudo pelo seu esforço, por meio de sua vontade. Se transforma, então, em uma máquina. Por vezes é até produtivo, mas torna-se um corpo sem coração.
E ainda pode ocorrer de o homem ter o entendimento das coisas, com compreensão e consciência, estar tomado de vontade impulsionadora, mas perder-se sem amor. É porque tudo aquilo precisa encontrar um sentido. A razão e a força precisam ser direcionadas e precisam de motivos. Sem um sentido, tornam-se desvairadas, perdidas. Por isso há filósofos tristes e grandes obreiros também. Estão seguindo, por vezes impetuosamente e conscientemente em uma direção, às vezes até em uma direção correta, mas sem integrar-se com a razão final. São quase-homens. Falta-lhes exatamente aquilo que integra tudo: o amor. É o amor que faz com que tudo tenha um sentido real e coloca o homem em sua verdadeira posição diante de Deus e do mundo.
Por tudo isso, posso dizer que não é possível sentir-se completo sem que a tríade humana manifeste-se por inteiro. Ninguém que queira sentir-se pleno, ninguém que procure saciar o seu ser, pode fazer isso sem elevar-se em todos os sentidos, por todas as suas partes.
Sabemos, enfim, que Deus, sendo o princípio e fim de todas as coisas, nele devem confluir tudo. Por isso, o primeiro mandamento é: Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e com todas as tuas forças

O coração para o corpo, a alma para o entendimento e tudo pelo amor. Isso apenas demonstra que o homem, para se achegar a Deus, não pode fazê-lo sendo somente parte de si mesmo. Necessita, sim, achegar-se por inteiro, a fim de desfrutar de uma relação plena com o Criador de todas as coisas.