“Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional”
(Romanos 12.1)
O sangue e a morte eram os componentes reais do sacrifício praticado no Velho Testamento. Por eles, através da entrega do corpo do animal a ser abatido, era concedido o perdão divino. Tudo, no entanto, era figura do sacrifício definitivo, oferecido pelo próprio Cristo. Ele, que entregue e morto, derramou seu sangue, e agora de maneira definitiva, para o perdão dos pecados dos homens. Não há mais, portanto, necessidade de qualquer sacrifício de morte, pois o de Jesus Cristo foi perfeito e perpétuo. Então, quando Paulo faz a analogia, exortando pela oferta dos próprios corpos como sacrifícios vivos, ele o faz com referência não ao sangue, nem à morte, mas aos outros componentes compreendidos no ato de sacrificar.
O sacrifício no Velho Testamento compreendia a entrega de um animal sem defeitos para ser abatido diante do altar do Senhor. Lançando mão desse conhecimento, o apóstolo conclama o povo cristão a, como se fazia com animais, que eles se façam a si próprios: entreguem-se plenamente ao Senhor de suas almas. A analogia, portanto, é perfeita. Retirando os componentes de sangue e de morte, restam a entrega total, a sujeição plena e a resignação. Como cordeiros, Paulo anima os cristãos a oferecerem a si mesmos como sacrifício, alienando-se totalmente diante de Deus, submetendo-se completamente à Sua vontade, aceitando plenamente o destino traçado por Ele. Não cabe ao sacrifício discutir os altos desígnios de Deus, mas, obediente e submisso, deitar-se no altar eterno, deixando com que o fogo do Senhor o consuma e o purifique.
O que se pede, à maneira dos antigos sacrifícios, é que ele seja santo e agradável. Separados deste mundo, separados para Cristo, esta é a santidade requerida. Como Jesus mesmo disse, não somos este mundo e não temos parte com ele1. Portanto, a separação é requisito essencial do sacrifício moderno. Apenas assim, na verdade, tornar-se-á agradável, pois é a separação que o torna puro, pois passa pela justificação de Cristo. É agradável porque é da maneira como Deus espera.
A exortação de Paulo é séria e a analogia perfeita. Quem deseja ser cristão e agradar a Deus não pode se contentar em servi-Lo desleixadamente, entregar as sobras e não as primícias ou não oferecer o que tem de melhor em si. Não se deve oferecer pão imundo, animal cego, coxo ou enfermo, pois Deus não aceitará a oferta das mão de quem assim procede2. Sim, precisamos ser puros na intenção e sem defeitos no juízo. Apenas assim agradaremos ao Senhor.
O culto, ou seja, a oferta, o louvor, a dedicação devem ser realmente compreendidas como um ato ofertório consciente. O chamado culto racional, o logiken latreian (λογικην λατρειαν), nada mais é do que a oferta consciente da própria vida no altar de Deus. É consciente porque se dá pela compreensão de quem é Jesus Cristo e qual o seu papel na economia salvífica do Evangelho. É racional porque não se dá por meio de um salto gnóstico, pelo qual a verdade se descortina como em mágica, mas, sim, através da conscientização progressiva de nossa posição diante de Deus, compreendida, principalmente, na revelação de Jesus Cristo.
Sacrifício vivo, enfim, é o homem que, conscientemente e sem reservas, se dispõe a ser devorado pelo fogo salvador do céu.
1João 17.14
2Malaquias 1.7-10
Sacrifício Vivo (Culto Racional)