(Homenagem pelas 'Bodas de Prata" do Pastor Fernão e da Eliane)
Jó afirmou com sabedoria “Vim nu para este mundo e sairei dele, da mesma forma: nu”. Quando somos dados à luz nada temos: roupas, bens, amigos, esposa. Quando a luz se apaga, seguimos, da mesma forma, sem nada: sem roupas, sem bens, sem amigos, sem esposa. E quem pode negar essa verdade? Podemos dizer que vimos só, e vamos só. Existe uma solidão intrínseca em cada pessoa, atestada pela verdade da própria natureza do nascimento e da morte. Mas, entre esses dois trágicos eventos há um período no qual esse caráter solitário é arrefecido. Há um lapso temporal que é preenchido pela união de um homem e de uma mulher, os quais constituem entre si um núcleo que será a fonte de novas solidões que serão geradas.
O próprio Deus afirmou que não seria bom para o homem permanecer só. O criador perfeito viu que sua criação ainda não estava completa. Se não era bom o homem estar só, e se Deus apenas pode criar aquilo que é bom, enquanto não criasse a mulher, a criação de Deus não estaria perfeita. Portanto, a mulher, pode-se dizer, foi tão necessária à criação como o homem. Apenas cronologicamente criada posteriormente a ele.
A unidade que se forma dessa união é algo bem maior do que a soma de duas vidas. Uma cooperação é a junção de esforços em torno de um objetivo comum. Porém, a cooperação não pressupõe nada mais do que individualidades que se ajudam mutuamente. Na união conjugal há algo ainda maior. Não é apenas cooperação, não é somente acordo. Vemos, na verdade, ocorrer uma fusão. São duas substâncias que, a despeito de manterem suas aparências externas inalteradas, exceto pelo devir natural, acabam por se confundirem nos aspectos mais interiores de suas existências. Há uma verdadeira confusão! E não se prendam ao uso popular desse termo. Confusão é a mistura de tal monta que torna impossível identificar as unidades separadamente.
Quantas vezes não ouvimos o homem dizer algo e depois alguém comentar: “Isso não é idéia dele, isso é coisa da mulher dele!”. Ou então: “Ela fica falando igualzinho ao marido dela”. Glória a Deus! Essa é exatamente a proposta do Altíssimo. “Tornar-se-ão uma só carne”. E como a carne, sendo física, não pode misturar-se, Deus só poderia estar falando desses aspectos mais profundos do ser. Santa confusão é o casamento! Bendita mistura de substâncias formando um novo ser: o casal.
Entre os casais, há diversas maneiras de expressarem seu amor. O beijo, o abraço - os mais comuns; A beliscada, a mordida - os mais atrevidos. Mas há uma maneira - que é a preferida dos pais mais zelosos pela virtude de suas filhotas - que são as mãos dadas. Enquanto o beijo é a colisão de dois desejos e o abraço o encontro de corações, é o entrelaçamento das mãos que simboliza, ao menos para mim, o que há de verdadeiro na união entre duas pessoas. No enganchar dos dedos há uma mistura visual que dá a impressão de não mais existirem duas mãos, mas um outro membro, que não mais uma mão, mas, poderíamos dizer, uma hiper mão. No casamento ocorre o mesmo: a individualidade é diluída, surgindo como que uma super individualidade. O novo ser - casal - não são dois indivíduos que se ajudam, mas é um novo indivíduo, mais forte, mais valoroso, mais humano. Talvez o super-homem nietzcheniano sempre tenha existido, apenas não captado por seu idealizador.
Nessa mistura, a fraqueza de um é compensada pela coragem do outro. A soberba de um é aliviada pela humildade do outro. A mansidão de um é equilibrada pela intempestividade do outro. A audácia de um é temperada pela prudência do outro. Por isso, acho que muitos sofrem na solidão, ainda, por estarem buscando afinidades, quando poderiam simplesmente se permitir viver a diferença que completa, os antagonismos que se equilibram, as aparentes incompatibilidades que são, na verdade, a completude do ser.
Mas como esta é a celebração, não do início de uma união, mas de sua permanência, quero compartilhar com vocês o que eu entendo sobre amor perfeito. Se perguntarmos para qualquer pessoa recém apaixonada, sobre a razão de tal paixão, as respostas não variarão muito. Percorrerão os elogios físicos, psicológicos e comportamentais. E isso é bom, mas não é perfeito. Aquelas que já vivem um relacionamento há algum tempo responderão, invariavelmente, de maneira um pouco mais abstrata, exaltando a amizade, o companheirismo e as virtudes morais do outro. Isso é muito bom, mas ainda não é perfeito. Acredito que o amor perfeito, ao ser indagado das razões de seu amor, responde em alto e bom som: “Não sei!”. Como alguém que ama seu próprio corpo, o amor perfeito talvez nem mais saiba explicar a razão desse amor, mas sabe perfeitamente que sem ele não é mais o mesmo. Ninguém, ao ser ameaçado de amputação de qualquer parte de seu corpo, passa a expor para o torturador das razões úteis ou estéticas daquele membro. Simplesmente, o horror da amputação, por si só, faz tremer todos os ossos. Saber que perderá uma parte do corpo é uma idéia aterrorizadora, por si mesma. No amor perfeito é assim: ainda que não se ache mais a razão do amor, a simples possibilidade de perder o outro é idêntica à idéia da amputação. O amor perfeito, conforme entendo, não ama mais por causa de algo, mas simplesmente ama. Como não nos amamos por causa de alguma característica em nós, mas por sermos nós. Com exceção dos que sofrem de alguma patologia mental, o homem saudável não se apaixona por suas próprias virtudes, apenas se ama por natureza. O casal que experimenta o amor perfeito se ama, não pelas virtudes próprias, mas por não poder conceber a vida sem ele mesmo. O que ao indivíduo é inconcebível - a amputação, no casal também passa a ser impensável. Para o casal que atinge o amor perfeito, separação é o mesmo que amputação.
Diante disso imaginemos que os cônjuges nunca discordam? Jamais há um conflito entre eles? Pelo contrário! Qual homem que não discute consigo mesmo? Qual pessoa que não vive a equilibrar seus conflitos? Isso é humano e isso é saudável! Triste do homem que não possui discordâncias internas, complexidades e incoerências - é um psicopata; um doente. Por isso não se iludam com a idéia do casal que não tenha esses conflitos. Eles são naturais, saudáveis e necessários. Essa dialética do casal é que o torna mais forte, renovado e aprovado. O resultado não é um casal que soma as características de dois indivíduos. É um novo ser que é mais forte que a soma dos dois, é uma fusão que dá forma há um novo ser, com características próprias, mais virtuosas, mais valorosas.
Interessante como a lei humana tenta, muitas vezes, refletir uma verdade natural. Havendo o casamento, uma das primeiras providências legais é associar o nome de um dos cônjuges ao outro. Mais comum, a mulher toma o sobrenome do marido e agrega ao seu nome. Daria eu uma sugestão: por que a lei não vai mais adiante, e para refletir bem a realidade não permite que os próprios nomes sejam misturados? Não seria interessante? Em nosso caso, o casal que aqui está, ao invés de se chamarem Fernão e Eliane, poderiam se chamar Elião e Ferliane. Perfeito! Os pais, que com tanto afeto escolheram os nomes de seus filhinhos, teriam, já aí, a certeza de que perderam suas crias para aquele estranho que não apenas raptou seu filho, mas também tomou posse de seu nome. Aí sim, estaria caracterizada, perfeitamente, também na realidade concreta, a verdade que já aconteceu na realidade espiritual.
Pois, quem conhece o casal, sabe que andam os dois verdadeiramente no mesmo espírito. E que lição é esta para a igreja! Esta, como a noiva de Cristo, é chamada para ser um com ele, vivendo em um mesmo espírito com seu esposo. E o que é isso além da mistura, pela qual a vontade de um se confunde com a vontade do outro? O Senhor nos ensina que sejamos um com ele. Como um casal que é um. Por isso quando nos deparamos com um casal que vive a unidade, podemos nos espelhar nele, não apenas como exemplo de matrimônio, mas como modelo de comunhão com Deus. Como nos dispomos a servir nossos cônjuges, assim devemos nos dispor para servir a Deus. Como nos preocupamos em agradar nossos cônjuges, assim devemos querer agradar a Deus. A fusão que é o casamento, assim seja - uma fusão, a nossa união com Cristo. Como experimentamos as delícias do casamento, assim também há eternas delícias no relacionamento com Jesus.
Bendito seja Deus, nosso mestre, que nos ensina não somente por dogmas e doutrinas, mas pela vida! Na instituição do casamento, há mais verdade do que compêndios e compêndios de teologia sistemática. Na simples celebração do tempo de união de um casal, podemos aprender muito sobre Deus.
Portanto, pastor Fernão e Eliane, compreendam isso: o exemplo de vocês extrapola a lição sobre casamento. Ele nos ensina que, se é possível uma verdadeira comunhão entre duas pessoas, muito mais é possível uma profunda comunhão com Cristo. Pois se somos imperfeitos, e, ainda assim, podemos nos manter juntos, quanto mais com Cristo, que é perfeito, amoroso e bondoso eternamente. Amém!
Jó afirmou com sabedoria “Vim nu para este mundo e sairei dele, da mesma forma: nu”. Quando somos dados à luz nada temos: roupas, bens, amigos, esposa. Quando a luz se apaga, seguimos, da mesma forma, sem nada: sem roupas, sem bens, sem amigos, sem esposa. E quem pode negar essa verdade? Podemos dizer que vimos só, e vamos só. Existe uma solidão intrínseca em cada pessoa, atestada pela verdade da própria natureza do nascimento e da morte. Mas, entre esses dois trágicos eventos há um período no qual esse caráter solitário é arrefecido. Há um lapso temporal que é preenchido pela união de um homem e de uma mulher, os quais constituem entre si um núcleo que será a fonte de novas solidões que serão geradas.
O próprio Deus afirmou que não seria bom para o homem permanecer só. O criador perfeito viu que sua criação ainda não estava completa. Se não era bom o homem estar só, e se Deus apenas pode criar aquilo que é bom, enquanto não criasse a mulher, a criação de Deus não estaria perfeita. Portanto, a mulher, pode-se dizer, foi tão necessária à criação como o homem. Apenas cronologicamente criada posteriormente a ele.
A unidade que se forma dessa união é algo bem maior do que a soma de duas vidas. Uma cooperação é a junção de esforços em torno de um objetivo comum. Porém, a cooperação não pressupõe nada mais do que individualidades que se ajudam mutuamente. Na união conjugal há algo ainda maior. Não é apenas cooperação, não é somente acordo. Vemos, na verdade, ocorrer uma fusão. São duas substâncias que, a despeito de manterem suas aparências externas inalteradas, exceto pelo devir natural, acabam por se confundirem nos aspectos mais interiores de suas existências. Há uma verdadeira confusão! E não se prendam ao uso popular desse termo. Confusão é a mistura de tal monta que torna impossível identificar as unidades separadamente.
Quantas vezes não ouvimos o homem dizer algo e depois alguém comentar: “Isso não é idéia dele, isso é coisa da mulher dele!”. Ou então: “Ela fica falando igualzinho ao marido dela”. Glória a Deus! Essa é exatamente a proposta do Altíssimo. “Tornar-se-ão uma só carne”. E como a carne, sendo física, não pode misturar-se, Deus só poderia estar falando desses aspectos mais profundos do ser. Santa confusão é o casamento! Bendita mistura de substâncias formando um novo ser: o casal.
Entre os casais, há diversas maneiras de expressarem seu amor. O beijo, o abraço - os mais comuns; A beliscada, a mordida - os mais atrevidos. Mas há uma maneira - que é a preferida dos pais mais zelosos pela virtude de suas filhotas - que são as mãos dadas. Enquanto o beijo é a colisão de dois desejos e o abraço o encontro de corações, é o entrelaçamento das mãos que simboliza, ao menos para mim, o que há de verdadeiro na união entre duas pessoas. No enganchar dos dedos há uma mistura visual que dá a impressão de não mais existirem duas mãos, mas um outro membro, que não mais uma mão, mas, poderíamos dizer, uma hiper mão. No casamento ocorre o mesmo: a individualidade é diluída, surgindo como que uma super individualidade. O novo ser - casal - não são dois indivíduos que se ajudam, mas é um novo indivíduo, mais forte, mais valoroso, mais humano. Talvez o super-homem nietzcheniano sempre tenha existido, apenas não captado por seu idealizador.
Nessa mistura, a fraqueza de um é compensada pela coragem do outro. A soberba de um é aliviada pela humildade do outro. A mansidão de um é equilibrada pela intempestividade do outro. A audácia de um é temperada pela prudência do outro. Por isso, acho que muitos sofrem na solidão, ainda, por estarem buscando afinidades, quando poderiam simplesmente se permitir viver a diferença que completa, os antagonismos que se equilibram, as aparentes incompatibilidades que são, na verdade, a completude do ser.
Mas como esta é a celebração, não do início de uma união, mas de sua permanência, quero compartilhar com vocês o que eu entendo sobre amor perfeito. Se perguntarmos para qualquer pessoa recém apaixonada, sobre a razão de tal paixão, as respostas não variarão muito. Percorrerão os elogios físicos, psicológicos e comportamentais. E isso é bom, mas não é perfeito. Aquelas que já vivem um relacionamento há algum tempo responderão, invariavelmente, de maneira um pouco mais abstrata, exaltando a amizade, o companheirismo e as virtudes morais do outro. Isso é muito bom, mas ainda não é perfeito. Acredito que o amor perfeito, ao ser indagado das razões de seu amor, responde em alto e bom som: “Não sei!”. Como alguém que ama seu próprio corpo, o amor perfeito talvez nem mais saiba explicar a razão desse amor, mas sabe perfeitamente que sem ele não é mais o mesmo. Ninguém, ao ser ameaçado de amputação de qualquer parte de seu corpo, passa a expor para o torturador das razões úteis ou estéticas daquele membro. Simplesmente, o horror da amputação, por si só, faz tremer todos os ossos. Saber que perderá uma parte do corpo é uma idéia aterrorizadora, por si mesma. No amor perfeito é assim: ainda que não se ache mais a razão do amor, a simples possibilidade de perder o outro é idêntica à idéia da amputação. O amor perfeito, conforme entendo, não ama mais por causa de algo, mas simplesmente ama. Como não nos amamos por causa de alguma característica em nós, mas por sermos nós. Com exceção dos que sofrem de alguma patologia mental, o homem saudável não se apaixona por suas próprias virtudes, apenas se ama por natureza. O casal que experimenta o amor perfeito se ama, não pelas virtudes próprias, mas por não poder conceber a vida sem ele mesmo. O que ao indivíduo é inconcebível - a amputação, no casal também passa a ser impensável. Para o casal que atinge o amor perfeito, separação é o mesmo que amputação.
Diante disso imaginemos que os cônjuges nunca discordam? Jamais há um conflito entre eles? Pelo contrário! Qual homem que não discute consigo mesmo? Qual pessoa que não vive a equilibrar seus conflitos? Isso é humano e isso é saudável! Triste do homem que não possui discordâncias internas, complexidades e incoerências - é um psicopata; um doente. Por isso não se iludam com a idéia do casal que não tenha esses conflitos. Eles são naturais, saudáveis e necessários. Essa dialética do casal é que o torna mais forte, renovado e aprovado. O resultado não é um casal que soma as características de dois indivíduos. É um novo ser que é mais forte que a soma dos dois, é uma fusão que dá forma há um novo ser, com características próprias, mais virtuosas, mais valorosas.
Interessante como a lei humana tenta, muitas vezes, refletir uma verdade natural. Havendo o casamento, uma das primeiras providências legais é associar o nome de um dos cônjuges ao outro. Mais comum, a mulher toma o sobrenome do marido e agrega ao seu nome. Daria eu uma sugestão: por que a lei não vai mais adiante, e para refletir bem a realidade não permite que os próprios nomes sejam misturados? Não seria interessante? Em nosso caso, o casal que aqui está, ao invés de se chamarem Fernão e Eliane, poderiam se chamar Elião e Ferliane. Perfeito! Os pais, que com tanto afeto escolheram os nomes de seus filhinhos, teriam, já aí, a certeza de que perderam suas crias para aquele estranho que não apenas raptou seu filho, mas também tomou posse de seu nome. Aí sim, estaria caracterizada, perfeitamente, também na realidade concreta, a verdade que já aconteceu na realidade espiritual.
Pois, quem conhece o casal, sabe que andam os dois verdadeiramente no mesmo espírito. E que lição é esta para a igreja! Esta, como a noiva de Cristo, é chamada para ser um com ele, vivendo em um mesmo espírito com seu esposo. E o que é isso além da mistura, pela qual a vontade de um se confunde com a vontade do outro? O Senhor nos ensina que sejamos um com ele. Como um casal que é um. Por isso quando nos deparamos com um casal que vive a unidade, podemos nos espelhar nele, não apenas como exemplo de matrimônio, mas como modelo de comunhão com Deus. Como nos dispomos a servir nossos cônjuges, assim devemos nos dispor para servir a Deus. Como nos preocupamos em agradar nossos cônjuges, assim devemos querer agradar a Deus. A fusão que é o casamento, assim seja - uma fusão, a nossa união com Cristo. Como experimentamos as delícias do casamento, assim também há eternas delícias no relacionamento com Jesus.
Bendito seja Deus, nosso mestre, que nos ensina não somente por dogmas e doutrinas, mas pela vida! Na instituição do casamento, há mais verdade do que compêndios e compêndios de teologia sistemática. Na simples celebração do tempo de união de um casal, podemos aprender muito sobre Deus.
Portanto, pastor Fernão e Eliane, compreendam isso: o exemplo de vocês extrapola a lição sobre casamento. Ele nos ensina que, se é possível uma verdadeira comunhão entre duas pessoas, muito mais é possível uma profunda comunhão com Cristo. Pois se somos imperfeitos, e, ainda assim, podemos nos manter juntos, quanto mais com Cristo, que é perfeito, amoroso e bondoso eternamente. Amém!
Mais que duas vidas