(pregação no retiro de 2009)
Imbuido da responsabilidade de trazer-vos a mensagem desta noite, decidi que o que precisamos, não apenas neste encontro, mas em nossa vida, são mais do que palavras bem concatenadas, bem mais do que idéias corretamente delineadas. Algo bateu forte em meu peito me mostrando que necessitamos de existência. E isso significa nada mais do que o nosso ser tomado pela fé que proferimos com nossos lábios, a ponto de a verdade bíblica revelada nos envolver de tal maneira que não apenas reverberamos trechos bíblicos decorados, mas vivenciamos a realidade da Palavra de Deus em nossos pensamentos, palavras e atos.
Diante disso, me vi impelido não a confeccionar um estudo sistemático de alguma passagem da Bíblia. Preferi, simplesmente, me assentar em um local silencioso e refletir sobre como anda minha relação com Deus. Meditando sobre a mensagem trazida pelo pastor ontem à noite, tentei botar em ordem, em minha cabeça, as questões que envolvem a minha existência, a minha fé e a minha conduta. Junto a tudo isso, certo que por uma providência divina, ficou em meu notebook o filme passado na reunião de ontem à noite, chamado 'O Livro Perigoso'. Bingo! Era exatamente isso que eu precisava!
Não é novidade que necessitamos de um compromisso sério com Cristo. Isso para que possamos encarar as adversidades da vida e, até mesmo, as perseguições e retaliações que podem surgir pelo fato de sermos cristãos. Nisso está contido o conhecimento profundo da Palavra de Deus, uma fé inabalável no poder de Jesus e um amor real pelo Senhor.
No entanto, uma coisa é sabermos o que é certo, outra é colocar em prática o que sabemos. Nós ouvimos a verdade, nos comovemos com ela, somos impactados por ela, mas nos deparamos com o mundo cotidiano e, invariavelmente, cedemos aos seus apelos. Isso faz com que desacreditemos da possibilidade de se vivenciar uma vida cristã plena, como vemos nos grandes exemplos cristãos que conhecemos. E vivemos assim, de inspiração em decepção. Rotineiramente nos inflamos de fé para que ela se esvazie na primeira esquina do mundo.
Senhor, como podemos mudar isso? Será que estamos condenados à derrota constante diante das forças deste mundo? Será que seremos perpetuamente a esperança de algo que nunca alcançaremos?
O apóstolo Paulo já nos ensinava como deveríamos nos colocar nesta vida. Na 2ª Epístola aos Coríntios, no capítulo 9, ele afirma que devemos ser como atletas que não medem esforços e sacrifícios afim de conquistar um prêmio material. Nós, então, que corremos em busca de um prêmio espiritual e eterno, quanto não devemos estar dispostos a nos entregar?
Você já observou como é a vida de um atleta profissional? Na busca de seus objetivos, ele se entrega de corpo e alma aos treinamentos e à preparação que poderá torná-lo um vencedor. Neste preparo, ele não mede esforços em abstinências, disciplinas e regras pessoais com o intuito de fortalecer o seu corpo e preparar a sua mente para a vitória.
Sem meias palavras, o apóstolo diz que esmurra o seu próprio corpo, reduzindo-o à escravidão, para que não seja, por fim, desqualificado. Isso já demonstra, em princípio, que ele sabia o que era realmente importante. O escravo é aquele que apenas obedece. O escravo não tem liberdade, por definição. Escravizar o próprio corpo é dizer para ele quem é o senhor. Paulo estava tentando nos dizer que precisamos dominar a nossa carne, precisamos dizer para ela quem manda. Se não fizermos isso, os escravos seremos nós, subjugados ao corpo e ao pecado, reféns da baixa vontade, sem autonomia para viver.
Mas essa disciplina, como alcançá-la? Essa santidade, como obtê-la? Será preciso apenas vontade, ou força, ou determinação? Será que basta ter fé para alcançar isso? Ao questionarmos dessa forma, nos sentimos ainda mais distantes do objetivo. Parece que decididamente devemos nos conformar com nossa iniqüidade e deixarmos a vida nos conduzir.
No entanto, não quero me conformar com isso. Quero, sim, cumprir minhas metas diante do Senhor. Longe de querer ser um super humano, longe de querer ser o mais santo dos homens, quero apenas ter consciência de que vivo um cristianismo agradável a Deus. Que serei aprovado por Ele. Que serei tido como um servo bom e fiel.
No filme citado acima, o irmão André diz, claramente, que quem não consegue ler a Bíblia inteira durante um ano é preguiçoso e não está fazendo a vontade de Deus. São palavras duras, mas que me fazem refletir sobre como anda o meu cristianismo. O que eu estou fazendo de mim mesmo, de minha fé, de minha eternidade, afinal. Até quando seguirei conduzindo as coisas de maneira relapsa, com pequenos arroubos de santidade, mas de grandes momentos de indiferença?
Tenho certeza que todos aqui, sendo cristãos verdadeiros, querem se sentir aprovados pelo Pai. Querem poder olhar para si e reconhecerem um cristão autêntico. Querem se sentir reais, sinceros. Querem sair daqui, irem para os seus quartos, olharem nos espelhos e reconhecerem a mesma pessoa que aqui estava orando, cantando e refletindo sobre as coisas do Evangelho.
Mas como cumprir aquilo que o irmão André disse ser obrigação de todo cristão, se a Bíblia, muitas vezes, nos parece chata, cansativa, entediante?
Precisamos, antes de tudo, saber o que nós queremos. Um atleta, quando se prepara para uma competição, ele tem seu objetivo claramente delineado. Todo o seu treinamento é baseado na preparação do corpo para que o objetivo traçado seja alcançado. Tudo o que ele faz e o que ele não faz visa esse alvo.
Diante disso, antes e qualquer coisa, precisamos saber qual é o nosso objetivo. O que queremos, por que estamos aqui. Qual o motivo de sermos cristãos. Qual a nossa esperança. É nesse sentido que Jesus diz que aquele que pretende segui-lo deve medir se é isso o que ele realmente quer. Não basta seguir a multidão. O verdadeiro discípulo de Cristo o segue porque sabe o que lhe espera, sabe o que o Mestre está lhe oferecendo e volta toda sua vida para este objetivo.
O cristianismo sempre esteve infiltrado por pessoas que não possuem nada com Cristo. Homens e mulheres que apenas encontraram algo bom, mas algo que não tomou conta de suas vidas. Por isso tantos, se dizendo cristãos, continuaram a viver de maneira tão pecadora. Por isso tantos, apesar de se acharem entre a Igreja, mantiveram seus passos de iniquidade.
Nós apenas vamos nos tornar verdadeiros seguidores de Cristo, quando suas palavras passarem a fazer parte não apenas do nosso conhecimento, mas da nossa vida. Quando ser cristão deixar de ser uma escolha, para ser uma impossibilidade de ser outra coisa, aí começaremos a experimentar o que realmente Deus tem para nossas vidas.
Se quisermos ter prazer em ler a Bíblia, não será apenas por curiosidade, nem mesmo pelo desejo de nos instruirmos. A Palavra de Deus só será prazerosa quando nós decidirmos que queremos encontrar a verdade e reconhecermos que nela está contida a verdade. Quando cada passagem da Bíblia nos trouxer não apenas conhecimento, mas solução existencial, aí começaremos a investigá-la com amor, com prazer, com vontade. É preciso antes de haver o desejo de conhecer a Bíblia, o desejo de conhecer a Deus. Se queremos Deus, de verdade, e reconhecermos que é na Bíblia que podemos encontrá-lo, então ela passará a ter um significado completamente diferente para nós. Cada palavra será uma preciosidade a ser decifrada, compreendida e absorvida no nosso ser.
Conquistado tudo isso, com o objetivo bem traçado, a disciplina e o sacrifício deixarão de ser um ato de desgosto, para, enfim, ter neles um significado verdadeiro.
Por fim, gostaria de dar mais um conselho para que não nos deixemos cair nas armadilhas do maligno e nos ver envolvidos pelas suas redes. A Bíblia, o tempo todo, nos informa que sendo cristãos, estamos em uma constante guerra. Paulo nos informa que vivemos em luta contra o diabo e seus anjos e Jesus diz que não podemos descansar, mas devemos nos manter vigilantes.
Interessante, pois estava eu lendo um livro de Agostinho, no qual ele conta a história de uma homem chamado Cipião Nasica, que, considerado um homem absolutamente virtuoso pelo Senado Romano, aconselhou-os, durante as Guerras Púnicas, que Roma não destruisse seu inimigo: Cartago. Seu motivo: sem inimigos, o povo relaxaria e daria vazão a toda sorte de iniquidades. Interessante que ele foi, inclusive, contra a importação dos teatros gregos, pois, segundo seu entendimento, esses teatros tornariam os homens mais suscetíveis à luxúria e a impureza.
Pensando em nossa vida, será que não estamos muito acomodados por não nos apercebemos que vivemos realmente uma batalha? Cercados de toda sorte de mordomia, a qual nos acostuma a não aceitarmos nenhum tipo de contrariedade, a não nos conformarmos com qualquer falta, percebemos que precisamos demais vigiar para não afrouxarmos as nossas defesas. Se realmente vivenciarmos aquilo que a Bíblia nos diz que acontecerá, se, de alguma maneira, sofrermos algum tipo de perseguição, de restrição ou de proibição, como enfrentaremos isso se não estamos treinados em viver na falta, na contrariedade até na injustiça?
Por isso, precisamos estar atentos para não permitirmos que as facilidades, os prazeres e o mal hábito amoleçam nossas almas e nos tornem presas fáceis do inimigo. Percebam como nos incomodamos com qualquer coisa que, mínimo que seja, nos importune. Uma pregação mais longa de um ministro, uma música menos interessante, um culto um pouco mais demorado, um estudo um pouco mais minucioso e, até, uma oração mais comprida de um irmão. Como enfrentar adversidades maiores se não suportamos a mais comezinhas?
Precisamos, sim, escravizar a nossa carne, disciplinar o nosso corpo, treinar a nossa mente e preparar o nosso espírito para que suportemos os dias mais difíceis que, provavelmente, experimentaremos num futuro não tão longínquo.
Como um Atleta